Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Ponto de Fuga

Ponto de Fuga

Évora: Quem vem de passagem deixa metade por ver

19.07.23 | Miguel Frazão

P1030271.JPG

Estive em Évora pela primeira vez algures em outubro do ano passado. Pensei que uma tarde chegava para visitar toda a cidade e a verdade é que consegui fazer tudo aquilo que tinha previsto. Da minha lista já tinha riscado a Igreja de São Francisco e a Capela dos Ossos, a Praça do Giraldo, o Templo Romano, o Jardim Público, a Universidade e o Palácio Cadaval.

P1030459.JPG

Sabia que lá teria de voltar uma segunda vez, nem que fosse pelo facto de não ter ido ainda à Catedral e ao Museu de Évora, entre outros locais que os leitores vão descobrir que eu ainda não descobri. No entanto, só tive a certeza de que voltar a Évora tinha sido efetivamente a escolha certa já depois de ter comprado o bilhete de autocarro e de saber que a Silvia e a Mara me iriam acolher no Old Évora Hostel, para não cometer novamente o erro de passar apenas uma tarde na cidade.

P1030553.JPG

É que dias antes, um amigo de seu nome Filipe e natural da vila alentejana dos famosos tapetes (Arraiolos) alertou-me para a existência de casas dentro das arcadas do Aqueduto Água de Prata.

P1030401.JPG

Foi aí que percebi que em outubro tinha tido tempo para visitar alguns dos pontos de maior interesse, mas os pormenores que se veem apenas a passear tinham escapado. A segunda visita a Évora valeu a pena, mas terá de haver uma terceira porque, por cinco minutos, não consegui chegar a tempo da última entrada no Museu Frei Manuel do Cenáculo, também conhecido por Museu de Évora.

 

Igreja do Convento de Santa Clara

Assim que saí da Estação Rodoviária limitei-me a andar em frente. Entrei nas muralhas de Évora e sem saber encontrava-me na Rua Serpa Pinto, onde se situa o Convento de Santa Clara.

P1030611.JPG

A porta da igreja estava aberta e descobri que lá dentro havia uma exposição fotográfica sobre os Cristãos Perseguidos, que despertou a minha curiosidade.

P1030247.JPG

O convento e a igreja foram casa de freiras clarissas, tendo esta sido a última comunidade religiosa a encerrar em Évora. Estávamos no ano de 1903. A partir daí, o edifício do convento foi Quartel de Infantaria, Escola Industrial e Preparatória.

P1030250.JPG

Deixo agora a Igreja e percorro o resto da rua até chegar à Praça do Giraldo.

P1030534.JPG

Praça do Giraldo

À semelhança da Rua Serpa Pinto, as restantes sete estradas que desembocam na Praça do Giraldo estão representadas nas oito bicas que se podem ver na fonte de estilo barroco, o principal cartão de visita da praça.

P1030253.JPG

Antigamente era conhecida como a Praça Grande de Évora. Não é que tenha deixado de ser grande, mas uma grande pessoa, Geraldo Geraldes – O Sem Pavor, mereceu ser ali homenageado por ter conquistado Évora aos mouros em 1167.

P1030257.JPG

Como já se consegue perceber, quem estiver na Praça do Giraldo e quiser continuar a sua visita à cidade tem oito caminhos diferentes para escolher.

P1030529.JPG

Eu virei logo à esquerda, para que pudesse riscar da minha lista o Aqueduto Água de Prata.

 

Aqueduto Água de Prata

Quando terminou de ser construído, em 1537, tinha cerca de 18 km de comprimento, estendendo-se desde a Herdade da Prata até à fonte com os leões de mármore, que se encontrava no lugar onde hoje está a fonte da Praça do Giraldo.

P1030607.JPG

Quase no fim do seu curso, na Rua Nova, podemos encontrar também a Caixa de Água do aqueduto, um legado do renascimento em Portugal.

P1030596.JPG

Sigo agora na direção da Sé de Évora, não sem antes apreciar o Templo Romano, algo que fiz mais do que uma vez ao longo deste dia.

 

Templo Romano

Na primeira vez que vim a Évora estranhei o facto de nas placas informativas referirem sempre Templo Romano, em vez de Templo de Diana.

P1030293.JPG

O mistério ficou depois resolvido e desta vez já olhei para o monumento que é Património Mundial da Unesco com olhos de quem já sabe que foi construído no século I d.c em homenagem ao Imperador Augusto e não à Princesa Diana.

P1030372.JPG

Do Templo Romano passo para a Catedral.

 

Sé de Évora

Há quem lhe chame apenas Sé, mas o seu verdadeiro nome é Basílica Sé de Nossa Senhora da Assunção e é a maior catedral medieval de Portugal.

P1030318.JPG

A sua construção remete-nos para o intervalo de tempo entre 1186 e 1250, pelo que não apresenta um estilo arquitetónico único. Há um pouco de tudo: românico, gótico, barroco e renascentista.

P1030362.JPG

O claustro, a igreja e o Museu são pontos obrigatórios, mas a vista da Torre para a cidade é o que mais surpreende e eu corri o risco de não poder usufrui-la.

P1030347.JPG

Tudo porque depois de se comprar o bilhete, a visita começa logo virando à direita em direção à Torre e eu limitei-me a ir em frente, começando assim pelo claustro.

P1030361.JPG

Ao sair da Sé podia ir logo até à Universidade, já que fica ali perto, mas preferi ir primeiro à Igreja de São Francisco e à Capela dos Ossos.

 

Capela dos Ossos

Posso já dizer que não entrei na Igreja de São Francisco, uma vez que um aglomerado de pessoas estava à porta a aguardar o início de um casamento. O mesmo aconteceu mais tarde na Igreja do Espírito Santo, onde me deparei com a noiva já a entrar de braço dado com o seu pai.

P1030423.JPG

Fico-me, portanto, pela Capela dos Ossos sem me queixar, dado que esta é uma das visitas obrigatórias para quem vem a Évora. O espaço é sinistro, mas a animação dos curiosos que ali se encontram a observar as mais de 5 mil caveiras que preenchem as paredes da sala tornam a experiência bastante leve.

P1030441.JPG

As crianças questionam, os adultos tiram fotografias e todos saem da Capela dos Ossos a refletir sobre a brevidade da vida humana, nem que seja pela expressão que está escrita à entrada: “Nós ossos que aqui estamos, pelos vossos esperamos”.

P1030445.JPG

Nos pisos superiores do edifício onde se ergue a Capela dos Ossos podemos visitar o Núcleo Museológico de Arte Sacra. Ainda assim, antes de subir as escadas há que parar para apreciar o presépio que representa o hipotético cenário de Jesus ter nascido em Évora.

P1030451.JPG

Logo ali ao lado está o Jardim Público de Évora, pelo qual não poderia deixar de passar.

 

Jardim Público

O Jardim Público de Évora tem de tudo: bancos para sentar junto ao coreto, caminhos para passear, parque de merendas e lugares com história. Foi construído entre 1863 e 1867.

P1030472.JPG

Ao percorrê-lo estamos a conhecer um espaço que outrora foi a horta do Palácio Dom Manuel.

P1030474.JPG

O edifício permanece intacto e logo ali ao lado estão as Ruinas Fingidas de Cinatti, entre as quais não é preciso muita sorte para encontrar pavões.

P1030476.JPG

O relógio aproxima-se das cinco da tarde e corro agora para o Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo, que está mesmo quase a fechar. Ainda fui a tempo de entrar no museu, mas não passei da bilheteira. Passavam agora cinco minutos das cinco da tarde e já não era possível fazer a visita. As coleções de arte e arqueologia ficam para uma próxima.

P1030495.JPG

Passo então para a última paragem do meu passeio: a Universidade de Évora.

 

Universidade de Évora

O portão está aberto e entro sem hesitar no edifício da Universidade de Évora.

P1030503.JPG

Não está lá ninguém, não só por ser fim de semana, mas também porque as aulas já terminaram. Atrás de mim está apenas uma família que segue os meus passos, talvez por pensarem que conheço bem aquele sítio. Percorro a segunda universidade fundada em Portugal sem nenhum tipo de orientação.

P1030507.JPG

O polo de Évora foi criado a pensar na necessidade de servir a população do sul do país em termos de ensino, uma vez que em 1537 tinha sido fundada a Universidade de Coimbra. A ideia foi de D. João III, mas foi o Cardeal D. Henrique quem a colocou em prática, ao fundar o Colégio do Espírito Santo, que mais tarde deu origem à universidade.

P1030509.JPG

O meu passeio terminou ali e chegou a hora de voltar ao alojamento, não sem antes passar pelo jardim junto ao Templo Romano, onde pude observar o pôr do sol.

P1030568.JPG

Quem estiver com carro pode sempre deslocar-se até ao Alto de São Bento, também conhecido como o Miradouro da Cidade. A sugestão não é minha, mas sim da Mafalda, que tão bem me recebeu no Old Évora Hostel, onde fiquei a dormir nesse fim de semana.  

 

Texto e Fotos: Miguel Frazão

A estadia em Évora foi oferecida pelo Old Évora Hostel. O roteiro conta ainda com o apoio da Diocese de Évora, Igreja de São Francisco e Museu de Évora, que me ofereceram as entradas na Catedral, Capela dos Ossos e Museu de Évora, respetivamente.

O meu melhor amigo chama-se Chafariz

Mourão, Alentejo

12.07.23 | Miguel Frazão

P1030623.JPG

Na manhã de domingo entrava no autocarro com um certo orgulho por ter escolhido aquele dia para visitar Mourão, uma vila alentejana bem próxima da fronteira com Espanha. “Hoje as temperaturas chegam aos 33 graus, se viesse amanhã já seriam 37”, dizia para mim, enquanto desvalorizava o calor que iria apanhar nos mais de 10 km que tinha planeado percorrer a pé.

Arrisco-me a dizer que esta foi uma das melhores viagens que fiz, mas ao mesmo tempo uma das mais solitárias. Tinha conhecido na véspera uma Évora cheia de pessoas, com quem tive oportunidade de interagir. Agora estava num autocarro quase vazio, que se resumiu a apenas seis passageiros quando saímos da paragem de Reguengos de Monsaraz em direção a Mourão.

Entretanto cheguei ao meu destino. A vila estava deserta, mas ouvia um coro. Tentei seguir o som, parecendo-me sempre que vinha da casa por onde passava naquele momento. Acabei por fazer o caminho até ao castelo. O coro conduz-me até à Igreja Nossa Senhora das Candeias (integrada no Castelo), na qual vejo entrar o reduzido número de habitantes de Mourão, que parece ignorar a beleza da sua arquitetura de estilo barroco. Passo a igreja e subo as muralhas do castelo que na crise dinástica de 1383-1385 apoiaram o Mestre de Avis, evitando que Portugal ficasse sob o domínio dos espanhóis.

Faz-me confusão a ausência de massa humana naquele que para mim seria um dos pontos mais turísticos de Mourão. De uma das torres do castelo observo a vizinha vila medieval de Monsaraz, para onde vai a grande maioria dos turistas. No meu caminho cruza-se agora um senhor que para ao meu lado para trocar umas palavras sobre a beleza de todo aquele património, aconselhando-me no futuro a visitar Monsanto e Penha Garcia. A conversa fica por ali, acabando eu por descobrir que o meu interlocutor também vem de Lisboa, e Mourão volta ao silêncio a que se submetia antes desta pequena conversa de circunstância.

Mais à frente, já quando seguia em direção à Praia Fluvial de Mourão, voltei a ter uma interação que durou pouco mais de um minuto, deixando-me novamente regressar ao “meu mundo”. A praia estava também praticamente vazia e as poucas famílias que lá estavam fizeram-me crer que afinal até estava bem ali sozinho. Nem as águas quentes do Alqueva (a temperatura média é de 26 graus) impediam os casais de discutir entre si, passando as suas irritações para os filhos.

Quando fazia o caminho de regresso entre a praia e a Praça da República, dei por mim a sorrir. Era sinal de que Mourão me estava a encher as medidas. Ainda agora, enquanto escrevo este texto, sinto o calor a tocar ao de leve na minha pele, o cheiro dos perfumes que vêm das janelas abertas e ainda oiço com nitidez as vozes do coro com que me deparei nessa manhã.

No entanto, faltava-me uma coisa: partilhar este sentimento de satisfação com alguém. Faço-o agora enquanto escrevo, fi-lo quando corri em direção ao painel que estava junto do Posto de Turismo e cliquei para tirar uma fotografia em 3, 2, 1… para de seguida a fazer chegar ao meu pai e ainda o fiz com aquele que se tornou melhor amigo por me ter salvo do calor: o chafariz. E aqui, todos eles, desde o do Largo Gouveia Furtado de Mendonça ao do Jardim Público, passando pelo da Praia Fluvial e até pelo do jardim em frente à creche, cuja água, para além de quente, fazia um trajeto irregular, foram melhores amigos.